No livro O Poveiro, Santos Graça deixou esta nota sobre a Santa Cruz de Balasar e as siglas que existiam na porta da respectiva capela:
Estiveram em risco de se perderem as marcas existentes na Capela da Santa Cruz de Balasar, deste concelho. Aproximava-se o centenário do dia em que, segundo a lenda, apareceram gravadas no chão e no local onde se construiu a capela as três cruzes do Calvário.
A confraria do Senhor da Cruz resolveu caiar as paredes e pintar a porta do templo para que a Capela se apresentasse asseada em dia tão festivo e memorável.
Aqueles riscos e sarrabiscas feitos à faca ou a canivete davam, para os mesários, um mau aspecto à porta. E deliberaram emassá-la para que a pintura tivesse mais realce! Felizmente, o acaso levou-me àquela freguesia naquela época e a tempo de saber o que se projectava. Abeirei-me dos mesários e fiz-lhe a proposta, que foi aceite, de lhes dar uma porta de boa madeira por aquela, ao mesmo tempo que os esclarecia do merecimento daqueles riscos. Dias depois apareceram-me para me dizer que ficava sem efeito o contrato.
A porta ficaria na capela, tal qual estava com as marcas, apenas coberta com uma camada de verniz para a sua conservação. Achei óptimo. A porta lá está, magnificamente conservada.
Foi louvável esta diligência, mas ele não andava muito bem informado: fala na lenda, ora o caso não era de lenda, mas de história; fala nas três cruzes, mas foi apenas uma.
Santos Graça fez ou mandou fazer um desenho das siglas que se viam na porta e foi bom porque a porta… Eu creio que ela existe, mas as gravuras estão quase apagadas, o que é manifestamente pena.
Está-se a preparar a comemoração dos 130 anos do nascimento deste poveiro. Seria bom que a comemoração fosse justa, isto é, que não fosse como a de quem faz um elogio, exaltando as qualidades e ignorando conscientemente os defeitos do elogiado.
Balasar, a Póvoa e o seu concelho têm todos graves razões de queixa contra o homem. No tempo em que era lugar-comum achincalhá-lo, as pessoas não eram desprovidas de senso. Chamavam-lhe o Amarelo e então gracejavam: Na loja do Amarelo, ao que se chama farinha deve-se chamar farelo. Ele esteve muitas vezes do lado errado.
Já aqui falei do caso do jornal Poveiro, que Santos Graças, há cem anos, levou a tribunal várias vezes, que censurou e que por fim fez encerrar; já falei dos arrolamentos – a nacionalização dos bens paroquiais – que ele dirigiu na qualidade de administrador; já falei do exílio do pároco poveiro que Santos Graça provocou… E, ao menos que eu saiba, pois nisso não me considero informado, nem a Ditadura Nacional nem o Estado Novo o beliscaram… Seria melhor que se homenageassem as vítimas de Santos Graça.
Ouçam-se estes versos, intitulados Não sai!... e publicados em 15 de Fevereiro de 1914, sem assinatura, n’ O Intransigente:
Sai do monte de Laundos
A água férrea e metais,
Sai o Afonso de ministro,
Só tu, Graça, não sais!
Saem mantas de Terroso
E d’Abremar batatais,
Os esterqueiros de Rates,
Só tu, Graça, não sais!
Da Estela saem pinhas,
Hortaliça de Navais,
Ezequiel de Beiriz,
Só tu, Graça, não sais!
Sai Malagueno da Câmara,
E da Junta o Magalhães,
Sai o Relvas de Madrid,
Só tu, Graça, não sais!
Sai do Governo “o das Ratas”,
Biológico, outros mais,
Só tu, caro Amarelo…
Não chores, que também vais!
No mesmo jornal, na semana seguinte, saiu um outro, que abria muito bem, mas que depois descaía em brejeirices. Tinha por título O Amarelo (Monólogo Carnavalesco) e começava assim:
O branco é cor da pureza,
O verde é cor da esperança:
Quem espera sempre alcança
O seu bem que anseia, belo.
Azul é a cor do céu,
Vermelho é a cor do sol,
Do formoso arrebol,
- Desespero… o Amarelo!
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