quinta-feira, 19 de julho de 2012

O Tombo de Balasar de 1542


Há um documento balasarense contemporâneo da juventude de Luís de Camões e é dele que vou falar. Trata-se do tombo desta freguesia, que remonta a 1542.
O pároco de então chamava-se Manuel Gonçalves e, apesar de ter com certeza um rendimento invejável, queria fazer um registo preciso das fontes da sua receita, e foi isso que o levou a promover a elaboração do tombo.
O P.e Manuel Gonçalves deve constituir uma das manchas mais negras da longa lista dos párocos de Balasar, onde houve sacerdotes tão dignos como o P.e Leopoldino ou o depois arcipreste António Martins de Faria.
Este abade, como então se dizia, teve ao menos uma filha, Margarida Álvares, que está na origem da Quinta de D. Benta. E como conseguiu o pai as terras da nova quinta? Desanexando-as do Casal da Igreja. Isso não prejudicaria muito o rendimento dos párocos posteriores: as rendas que vinham dum caseiro passavam a vir de dois. E em breve a criação da Comenda de Balasar iria canalizá-las para os comendadores.
A década de 40 do séc. XVI é muito importante na história da Igreja pois foi então que ganhou força o movimento para a expurgar dos muitos abusos que se tinha tornado comuns. Este pároco é exemplo desses abusos, não da extirpação deles…
Em 1542, o arcebispo de Braga era um filho bastardo do Rei e tinha 22 anos de idade…
Não imagino por que artes, o abade de Balasar era então também abade não só de Gresufes, mas ainda de Gondifelos e de S. Marinha de Vicente. Mas devia sê-lo só para receber as rendas já que para as actividades propriamente paroquiais essas freguesias tinham um sacerdote.
Sendo assim, o Tombo de Balasar de 1542 é também o tombo de Gondifelos, mas isso a mim não me interessa pois só me ocupo com Balasar.
Na altura de se constituírem as paróquias, os nobres do tempo hão-de ter tido o cuidado de dotarem os párocos de rendimentos que lhes permitissem viver sem dificuldades de maior: as pessoas comuns seriam tão pobres que pouco poderiam contribuir para o seu sustento.
O Casal da Igreja de Balasar, que teria com certeza essa origem, era constituído por muitas propriedades, mas era só ele a pagar rendas ao pároco, os outros pagavam apenas o dízimo. Mas não era assim em Gresufes: aí, além do Casal da Igreja propriamente dito, de Gresufes, mais três casais pagavam tais rendas, o de Vila Pouca, o de Além e ainda um terceiro de fora da freguesia, o Casal de Crujes, em Santa Marinha de Vicente. Era muita renda! E tudo agora vinha para o abade Manuel Gonçalves.
Para minha surpresa, em 1542, a Igreja de Balasar parece que já estava no Matinho. Aparentemente, o conjunto principal das propriedades da paróquia nunca estivera nem no Lousadelo nem no Casal, onde se haviam construído as igrejas anteriores, mas ali no Matinho. Isso teria facilitado a construção da nova igreja, que precisava de ficar próxima de Gresufes.
Um aspecto interessante do Tombo de Balasar de 1542 é o registo dos limites da freguesia. É muito diferente dos dois tombos da Comenda: começa no sítio certo, na delimitação de Balasar com Gondifelos. Fora ali que noutros tempos a freguesia mais estreitamente contactara com o exterior. Depois passa a S. Marinha de Vicente, hoje Gondifelos, a S. Veríssimo de Pedrafita, hoje lugar de Cavalões, a Vilarinho, Fradelos, S. Martinho do Outeiro, Bagunte, Arcos, Rates, Macieira e finalmente Negreiros. Balasar é uma freguesia muito grande.
Esta delimitação identifica dois monumentos megalíticos, duas mamoas: uma nos limites de Balasar com S. Marinha de Vicente, próxima portanto do Castro de Penices, e outra que ficava próxima do ponto onde se encontram Balasar, Rates e Macieira.
Veja-se como era constituída parte habitada do Casal da Igreja de Santa Ovaya de Balasar:
“Primeiramente, uma casa sobradada, que tem uma sala e duas câmaras (quartos) e uma cozinha, todas telhadas. Outra casa telhada que serve de câmara. Pegado com o cabido (alpendre) da dita igreja, quatro casas térreas telhadas e uma delas colmaça (casas telhadas deveriam ser a residência e celeiros do pároco, a colmaça podia ser estábulo).
Uma casa colmaça (coberta a colmo) em que vive o caseiro. Um eido com duas cortes. Mais duas cortes de gado colmaças. Um pombal pegado com as casas. Um tapado que levará um quarto de semeadura, que serve de colmeias. Uma eira pegada com o adro e abaixo da eira um cortelho tapado sobre si que levará de semeadura um alqueire e meio”.
Camões também terá vivido numa casa colmaça? Com certeza não, em Lisboa vivia-se melhor.