Eu tenho vindo a abordar temas balasarenses, mas hoje vou tratar um que não tem a ver com Balasar. Vou falar dum professor que ensinou no Liceu poveiro há muitos anos e que se chamava Paulo de Cantos.
Um dia ouvi falar dele e até me mostraram vários livros que escreveu. Isso provocou-me alguma curiosidade uma vez que me vinha a interessar por professores do Liceu que tivessem deixado obra publicada. Então fui ler um artigo que o estudava no Boletim Cultural e dois que o Dr. Jorge Barbosa escrevera n’A Voz da Póvoa. Mais adiante, publiquei um pequeno artigo sobre Paulo de Cantos no jornal da ESEQ, a sucessora do Liceu, e muito recentemente abri um blogue onde coloquei informação sobre cerca duma dezena de professores da minha escola, entre eles o Prof. Paulo de Cantos.
Recentemente, uma associação de Lisboa, com patrocínio do Governo, da Secretaria de Estado da Cultura e da Direcção-Geral das Artes, promoveu umas Jornadas Cantianas. Cantianas, isto é, sobre Paulo de Cantos. Isto é surpreendente. Quem diria que um professor que ensinou na Fábrica do Gás ia merecer tal consagração? Mas não é tudo, na Capital Europeia da Cultura ele terá merecido uma exposição. Quer isto dizer que Paulo de Cantos está a ser redescoberto e muito valorizado.
O Prof. Paulo de Cantos nasceu em Lisboa (Ajuda) em 13 de Março de 1893 e aí faleceu em 9 de Abril de 1979. Segundo o Dr. Jorge Barbosa este professor, que era muito rico, frequentou as Universidades de Lisboa, Porto e Coimbra. “Dotado de grande inteligência, curiosidade e ânsia de saber e possuidor duma prodigiosa memória, fez vários cursos, concluindo licenciaturas em Matemáticas, Desenho, Físico-Químicas, Ciências Naturais e Biológicas, Línguas Românicas (Filologia Românica), segundo julgo, e ainda Cursos de Belas-Artes e até tirou, entre outros, um diploma em Vitivinicultura”.
Foi depois professor do ensino liceal, começando pelo Pedro Nunes (Lisboa) e posteriormente leccionou no Liceu Eça de Queirós, no qual passou a maior parte da sua vida professoral, chegando a ser reitor cerca de 10 anos.
Sobre a bibliografia do Prof. Paulo dos Cantos escreveu ainda o mesmo articulista:
É muito grande, complexa, original, singular e, porque não dizer, extravagante a bibliografia deixada pelo Dr. Paulo de Cantos.Além do Dr. Jorge Barbosa, que publicou os seus dois extensos artigos n’A Voz da Póvoa em 16/9/93 e 14/10/93, também sobre este antigo reitor da nossa Escola escreveu Ney da Gama Simões Dias, no vol. XXXIII, de 1996/1997 do Boletim Cultural Póvoa de Varzim. Aí aproxima a produção artística do Prof. Paulo de Cantos do movimento alemão da Bauhaus.
As Jornadas Cantianas propunham-se apresentar, pela primeira vez, a obra (possível) do autor (livros, maquetas e objectos) ao público, convocando igualmente autores do design, tipografia e crítica cultural para um ciclo de conferências em torno de temáticas tangenciais à obra do autor.
A Paulo José de Cantos descrevem-no como “um ilustre desconhecido dos meandros bibliófilos, um prolífico pedagogo Povoense impelido pela publicação, banzado por tipografia, por acrósticos destravados e pelo universalismo da língua e da lusofonia. Paulo de Cantos foi um auto-editor de invulgares, idiossincráticos, inclassificáveis e imprudentes livros que povoam (cada vez menos) as prateleiras de várias lojas de alfarrabistas”.
Chama-lhe o primeiro surrealista português em grafismo, isto é, reconhecem-lhe a originalidade extravagante que já lhe notara o Dr. Jorge Barbosa.
A Escola Secundária de Eça de Queirós possui alguns livros da autoria do Prof. Paulo de Cantos provenientes da biblioteca do Mons. Manuel Amorim.
Eu vou terminar lendo uma anedota que o Prof. Paulo de Cantos contou, em 1934, na abertura do ano lectivo do Liceu ou a “ singular historieta de certo aldeão que tinha um bom pedaço de terra crua na sua freguesia”.
Um dia passou por lá um caçador da cidade, parou, observou-o e disse-lhe:
- Mas que rica terrinha você aqui tem! Isto naturalmente dá trigo!?
- Não senhor - responde o homem - não dá.
- Admira. Então milho dá, com certeza!
- Engana-se Bossa Senhoria, também não dá.
- Essa agora tem graça! Mas olhe lá, ó santinho, você já experimentou aqui alguma vez semear?
- Ora, ora, adeus! - retorquiu o patego - Pois semeando é claro que dá…
Os alunos naturalmente dão pouco ou nada, mas se trabalharem produzem.
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