Foi ainda há poucos dias que o Santuário
de Fátima recebeu uma enchente de peregrinos e também foi há poucos dias que
recebi um livro em inglês com o título de Fatima
Prayerbook, Livro de Orações de Fátima. Vou por isso falar um pouco de
Fátima, mas também de Balasar.
Um dia estava eu em Balasar a conversar
com uma senhora que se pretendia muito conhecedora da biografia e da mensagem
da Alexandrina e falou-se de Fátima. Ela quis logo dizer que era oportunismo
tentar estabelecer uma ligação entre Fátima e Balasar. Mas não é assim: o
próprio P.e Humberto, que era italiano, mas que conheceu bem a mensagem de
Fátima e que se correspondeu longamente com a Irmã Lúcia, escreveu um livrinho
com o título de Fátima e Balasar, Duas
Terras Irmãs.
O principal ponto de contacto entre
Balasar e Fátima é a Consagração do Mundo ao Imaculado Coração de Maria. A
ligação entre as duas terras é a mais estreita no processo com que se
desenvolveram as diligências para a Consagração e sobretudo no momento dessa
Consagração, que correspondeu à celebração dos 25 anos das Aparições.
Mas o centenário das Aparições
aproxima-se. De facto, elas ocorreram ainda no contexto do grande desvario da
Primeira República. As perseguições a que os pequenos pastores foram sujeitos
estão na directa sequência das ideias que levaram à extinção das Ordens
Religiosas, à expatriação dos Jesuítas, à expulsão dos bispos das respectivas
dioceses, etc.
Sobre este período, vou ler uma citação
dum artigo escrito em 1923 pelo arcipreste
António Gomes Ferreira, pároco de Terroso, mas natural de Balasar.
Começa por caracterizar os tempos que se
seguiram ao golpe de estado republicano:
Os tempos foram
passando e um dia rebentou a revolução de 5 de Outubro.
Os
revolucionários por toda a parte perseguiam tudo o quer cheirasse a religião,
espatifando tudo, arrastando tudo com uma fúria que dava a ideia que foram
muitos manicómios que vomitaram para a rua os seus moradores. Tudo foi
perseguido, mas nomeadamente os Jesuítas… Esses foram monteados como feras da
pior espécie e passaram os trabalhos e as inclemências que se lêem com lágrimas
nos Proscritos.
Por essa ocasião
estava eu em minha casa de Balasar a tratar das vindimas e fui muito cedo para
a igreja a fim de celebrar a Santa Missa e vir presidir aos trabalhos da minha
casa.
Depois refere um caso acontecido com um
Dr. Campos, sacerdote secular natural de Balasar que se fizera jesuíta:
E quando, depois
de fazer a minha preparação, me dirigi à sacristia da Igreja para me
paramentar, vi através dos vidros da janela um vulto que espreitava, cauteloso
e com manifesto receio de ser descoberto.
Aproximei-me e
reconheci o amigo de tantos anos, o Dr. Campos!
Corri logo à
porta para lhe dar o abraço de saudade e certificá-lo de que ali, naquele remanso
pacífico da nossa aldeia, ainda não tinha chegado a república, que estivesse
sossegado.
O Dr. Campos
contou os trabalhos que tinha tido para chegar ali da residência de Guimarães,
onde se encontrava, sempre perseguido, na sua própria terra e pelos irmãos e
patriotas.
Na sua
freguesia, que tantas vezes lhe serviu de remanso, de paz e de conforto, ele
encontrava sossego.
E para que se não pense logo que este
arcipreste era um sacerdote pouco esclarecido, Rocha Peixoto chamou-lhe
“exemplaríssimo sacerdote”, a propósito da colaboração que dele recebeu numa
campanha de estudo da Cividade de Terroso.
1923, o ano em o arcipreste António Gomes Ferreira escreveu o seu
artigo, foi o ano do ataque aéreo à Capelinha das Aparições, que profundamente
a danificou.
E vou terminar com esta reflexão:
há muita gente que se quer fazer passar por sabida e que tão exigente é com a
Igreja, mas que não assume estes desmandos e depois escandaliza-se que ela
tenha aceitado o Estado Novo bastante pacificamente. Mas se foi ele que lhe
devolveu a liberdade que ela há um século não conhecia… Comemorar as Aparições
de Fátima também deveria ajudar a conseguir isto.
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