domingo, 17 de junho de 2012

Balasar e Fátima



Foi ainda há poucos dias que o Santuário de Fátima recebeu uma enchente de peregrinos e também foi há poucos dias que recebi um livro em inglês com o título de Fatima Prayerbook, Livro de Orações de Fátima. Vou por isso falar um pouco de Fátima, mas também de Balasar.
Um dia estava eu em Balasar a conversar com uma senhora que se pretendia muito conhecedora da biografia e da mensagem da Alexandrina e falou-se de Fátima. Ela quis logo dizer que era oportunismo tentar estabelecer uma ligação entre Fátima e Balasar. Mas não é assim: o próprio P.e Humberto, que era italiano, mas que conheceu bem a mensagem de Fátima e que se correspondeu longamente com a Irmã Lúcia, escreveu um livrinho com o título de Fátima e Balasar, Duas Terras Irmãs.
O principal ponto de contacto entre Balasar e Fátima é a Consagração do Mundo ao Imaculado Coração de Maria. A ligação entre as duas terras é a mais estreita no processo com que se desenvolveram as diligências para a Consagração e sobretudo no momento dessa Consagração, que correspondeu à celebração dos 25 anos das Aparições.
Mas o centenário das Aparições aproxima-se. De facto, elas ocorreram ainda no contexto do grande desvario da Primeira República. As perseguições a que os pequenos pastores foram sujeitos estão na directa sequência das ideias que levaram à extinção das Ordens Religiosas, à expatriação dos Jesuítas, à expulsão dos bispos das respectivas dioceses, etc.
Sobre este período, vou ler uma citação dum artigo escrito em 1923 pelo arcipreste António Gomes Ferreira, pároco de Terroso, mas natural de Balasar.
Começa por caracterizar os tempos que se seguiram ao golpe de estado republicano:

Os tempos foram passando e um dia rebentou a revolução de 5 de Outubro.
Os revolucionários por toda a parte perseguiam tudo o quer cheirasse a religião, espatifando tudo, arrastando tudo com uma fúria que dava a ideia que foram muitos manicómios que vomitaram para a rua os seus moradores. Tudo foi perseguido, mas nomeadamente os Jesuítas… Esses foram monteados como feras da pior espécie e passaram os trabalhos e as inclemências que se lêem com lágrimas nos Proscritos.
Por essa ocasião estava eu em minha casa de Balasar a tratar das vindimas e fui muito cedo para a igreja a fim de celebrar a Santa Missa e vir presidir aos trabalhos da minha casa.

Depois refere um caso acontecido com um Dr. Campos, sacerdote secular natural de Balasar que se fizera jesuíta:

E quando, depois de fazer a minha preparação, me dirigi à sacristia da Igreja para me paramentar, vi através dos vidros da janela um vulto que espreitava, cauteloso e com manifesto receio de ser descoberto.
Aproximei-me e reconheci o amigo de tantos anos, o Dr. Campos!
Corri logo à porta para lhe dar o abraço de saudade e certificá-lo de que ali, naquele remanso pacífico da nossa aldeia, ainda não tinha chegado a república, que estivesse sossegado.
O Dr. Campos contou os trabalhos que tinha tido para chegar ali da residência de Guimarães, onde se encontrava, sempre perseguido, na sua própria terra e pelos irmãos e patriotas.
Na sua freguesia, que tantas vezes lhe serviu de remanso, de paz e de conforto, ele encontrava sossego.

E para que se não pense logo que este arcipreste era um sacerdote pouco esclarecido, Rocha Peixoto chamou-lhe “exemplaríssimo sacerdote”, a propósito da colaboração que dele recebeu numa campanha de estudo da Cividade de Terroso.
1923, o ano em o arcipreste António Gomes Ferreira escreveu o seu artigo, foi o ano do ataque aéreo à Capelinha das Aparições, que profundamente a danificou.
E vou terminar com esta reflexão: há muita gente que se quer fazer passar por sabida e que tão exigente é com a Igreja, mas que não assume estes desmandos e depois escandaliza-se que ela tenha aceitado o Estado Novo bastante pacificamente. Mas se foi ele que lhe devolveu a liberdade que ela há um século não conhecia… Comemorar as Aparições de Fátima também deveria ajudar a conseguir isto.

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