Hoje vou falar de algumas construções do
séc. XVIII.
É comum que ao longo dos tempos se
alternem períodos em que se constrói muito com outros em que se não constrói
quase nada. Um mau momento económico ou um esforço bélico param as construções
no país: sabemos o que o mau momento económico actual está a fazer às empresas
de construção civil.
No séc. XVIII, ao menos depois das duas
primeiras décadas, construiu-se muito.
A gente lembra logo o Convento de Mafra,
que foi obra régia, mas foi também dispendiosíssima a reconstrução da Baixa
Lisboeta pelo Marquês. E não foi obra feita em perspectiva exclusivamente
utilitária; também há ali fausto.
Aqui nas nossas redondezas, impõe-se
pela sua grandiosidade o Mosteiro de Santa Clara, aquela parte dele a que então
se chamou os dormitórios novos. Tem
algo de faraónico, de muito faustoso.
Mas há outras construções grandiosas,
embora de muito menos impacto, pois os responsáveis por elas não dispunham de
meios para mais. É o caso da Matriz da Póvoa de Varzim, que foi uma obra
modesta, ao menos em termos comparativos. Bem menos modesta foi a Igreja da
Lapa de Vila do Conde. De facto, a sua grandiosidade está sobretudo na fachada,
com aquelas duas caríssimas torres. Já o corpo da igreja é muito simples.
Também no concelho de Vila do Conde, há
a magnífica igreja do Mosteiro de S. Simão da Junqueira. Não há ali fausto
exagerado, mas é uma óptima construção.
Em Braga, há ao menos dois edifícios que
convém lembrar: os Paços do Município e voltada para eles uma nova ala do Paço
Arquiepiscopal. Coisas grandiosas nos dois casos. E deve-se ter em conta que o
arcebispo era então “senhor de Braga”, isto é, foi ele que os promoveu a ambas.
Já um pouco mais longe de nós, lembre-se
o Paço Episcopal do Porto e o Mosteiro de Refojos de Basto. A gente não vê como
podiam harmonizar-se o espírito evangélico e construções tão ricas, e de facto
não conheço que alguma vez se tenha promovido a canonização de algum dos
autores de dele.
Tendo-se construído tanto numa
perspectiva de ostentação, construiu-se pouco numa perspectiva utilitária. Por
exemplo, não se investiu na rede viária: estradas e pontes. A agricultura e a
indústria ficaram mais ou menos como antes quando o afluxo do ouro do Brasil
parou. Já tinha sido assim no séc. XVI.
Eu decidi falar das construções do séc.
XVIII tendo em mente Balasar, que eu estudo desde há alguns anos. Ali também se
construiu bastante, em edifícios bastante humildes, com uma excepção.
Ultimamente, conheci um documento de
quase duas dezenas de páginas no qual se pede autorização para a construção, no
lugar do Casal, da Capela da Senhora da Piedade. As diligências registadas
foram iniciadas em 1734 e só terminaram em 1737. Quem pedia a licença era um
balasarense residente no Porto, que era simultaneamente militar e sirigueiro: produzia e comercializava
artigos de seda. Chamava-se António da Costa Soares. Esta capela foi demolida
em 1919, pelo que se não pode dizer grande coisa dela.
De 1736, há um segundo documento, de
menor dimensão, em que se pedia autorização para benzer a capela-mor da Igreja
Paroquial. Fora reconstruída a capela-mor e foi reconstruído, talvez depois, o
corpo principal da igreja. Esta igreja, que foi demolida em 1907, era também
construção despretensiosa.
Sabe-se também que, pelo meio do século,
vários particulares melhoraram as suas habitações, como o testemunham as
inscrições que então se colocavam nas padieiras das portas, os lintéis. Cada um
faz o que pode: estes balasarenses não podiam fazer obra aparatosa, mas pelo
menos registavam ali a data da sua construção. Há lintéis sobretudo de meados
do século.
Balasar teve então também uma obra aparatosa,
embora de pequena dimensão – a Capela de Nossa Senhora da Lapa, na Quinta de D.
Benta. É uma pena que o interior se tenha arruinado quase completamente e
inclusive se tenham retirado elementos decorativos que lá se encontravam, mas o
exterior está em bom estado. Manuel Nunes, o brasileiro que a construiu,
conhecia com certeza bem várias das grandes construções dos poderosos do tempo
e imitou-as ali. Foi uma construção rica. Isso via-se no interior e via-se na
fachada, principalmente na porta. Em boa verdade, a riqueza desta capela tinha
algo de humilhante para a Igreja Paroquial e para a Capela da Senhora da
Piedade.
O século XVIII foi também o século da
talha, que criava nas igrejas e mesmo palácios um mundo feérico, de maravilha, de
irrealidade, de ouro.
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