No nosso arciprestado existem igrejas que são monumentos nacionais, igrejas monumentais mas não classificadas como monumentos nacionais, igrejas mais comuns e algumas igrejas muito humildes, muito simples e muito antigas também.
No mês de agosto, visitei algumas destas últimas, aquelas que poucos visitam e provavelmente muitos desconhecem. Hoje vou falar de três: da de Santagões, actualmente despromovida a capela mas que foi paroquial durante talvez sete séculos, da de Ferreiró, muito antiga também e que já foi um pardieiro cheio de silvas mas que depois foi restaurada, e da de Parada, ultimamente em reconstrução.
Estas três igrejas têm a particularidade de ficar todas na margem norte do Ave, próximas do rio.
Começo pela de Parada. Caso raro, certamente raríssimo, conhece-se a data da sua construção: ano de 952. O ano anterior ao primeiro documento que menciona pela primeira vez Vila do Conde e Via de Varzim. Esta data será aproximadamente a mesma das da maior parte das igrejas das freguesias do arciprestado, ficando de fora as paróquias criadas mais tarde, como a da Póvoa de Varzim, depois dividida em três; a de Aver-o-Mar, que se separou de Amorim; a da Aguçadoura, que se integrava em Nabais, e as Caxinas, que antes eram Vila do Conde. De facto, sabe-se que a maior parte das antigas já existiam em 1090. Embora o cristianismo já vigorasse por cá desde há muito, a organização paroquial como a conhecemos remonta a tempos posteriores à Reconquista.
Em 1090, Parada pagava anualmente ao Arcebispo um jantar ou certamente o equivalente em dinheiro ou géneros. Ora o nome Parada creio que designa mesmo a paragem para essa refeição. Na altura, talvez a paróquia fosse maior, para o que bastava que ainda não tivessem sido criadas as suas vizinhas. A verdade é que no tal documento de 952 chega-se a falar de baseliga, sem dúvida basílica, a propósito da igreja de Parada, o que poderá significar que ela fosse apenas um pouco maior que outras vizinhas ou nem isso, pois o significado das palavras varia muito ao longo do tempo.
A origem da pequena igreja da vizinha freguesia de Ferreiró deverá ser bem diferente. Enquanto na Vila de Parada a construção se deveu aos moradores, com algumas probabilidades, em Ferreiró, ela foi construção de algum nobre.
Por ocasião das Inquirições de 1220, regista-se, a propósito de Ferreiró, que juraram oito homens, incluído neste número o abade, e que não havia mais, excepto dois que estavam doentes. Esta informação coaduna-se bem quer com a pequenez da igreja quer com o que se conhece dos registos paroquiais, que nos dão a freguesia como muito pouco populosa. Por volta de 1900, escreveu-se sobre a igreja de Ferreiró o seguinte: "O seu aspecto é dos mais primitivos e singelos, sem torre nem galilé ou alpendre; não obstante, o pequeno âmbito deste pobre templo chegou de sobra para abrigar os fregueses durante as cerimónias de culto e para necrotério dos antepassados".
Esta igreja fica no centro dum descampado, que era o grande passal do abade local. O facto de a igreja ficar nesse descampado e no centro do passal, de a residência ser espaçosa e porventura ainda o facto de o pároco ter o título de abade, tudo poderá indicar que houve o cuidado obstar a que ele passasse penúria. Ora isto indiciará que andou por ali mão de gente abastada, nobre.
Na segunda metade do século XIX, houve um natural de Ferreiró que ascendeu a visconde, o Visconde de Santa Marinha da Trindade. Santa Marinha é a padroeira da freguesa e a palavra Trindade envia para uma capela local que ele ampliou a ponto de ficar muito mais espaçosa e rica que a igreja paroquial. Desde então, na prática a capela da Trindade ascendeu a paroquial e a pequena igreja paroquial caiu em ruína até ser recuperada há algumas dezenas de anos.
A igreja de Ferreiró tem um retábulo de talha no altar-mor. Poderá ser uma imitação recente de algo antigo, em pretenso estilo de talha nacional. Nas memórias paroquiais afirma-se implicitamente que a imagem da padroeira se encontra ao centro e que dos lados estavam imagens de S. António e de S. Francisco Xavier. Actualmente, a imagem da padroeira está ao lado e ao centro vê-se uma tela heterogénea, onde o primeiro lugar é ocupado por uma Nossa Senhora com a espada apontada ao coração, ao fundo representa-se um Purgatório e há ainda lugar para um S. Lourenço.
Em Santagões o retábulo, embora deva ter sofrido um grande restauro, aponta para uma composição que pode ter sido maneirista na origem. Ao fundo há como que uma base em toda a largura, ao centro está dividido em três secções verticais separadas por colunas e por cima há ainda como que um muito esbatido frontão. Na parte central vêem-se pinturas de dois anjos com instrumentos da crucifixão e ao cimo, numa outra pequena pintura, representa-se provavelmente S. Escolástica, irmã de S. Bento, a lembrar que a igreja tinha estreita ligação ao Mosteiro beneditino de Vairão.
Todas estas três igrejas são pequenas, todas são muito antigas, em nenhuma houve grande investimento artístico. A que faz melhor figura ainda é a de Santagões.
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